FODMAPs? O que é a dieta (pobre em) FODMAPs? Recomendada em crianças?

5 de agosto de 2017

FODMAPs? O que é a dieta (pobre em) FODMAPs? Recomendada em crianças?

– FODMAPs: o nome refere-se a uma sigla, que abrevia Polióis, Monossacarídeos, Dissacarídeos e (And) Oligossacarídeos Fermentáveis. Esse termo foi estabelecido em 2005 por um grupo da grupo da Universidade Monash, de Melbourne, na Austrália (Gibson and Shepherd). Há um interesse crescente no assunto, o que se torna evidente quando se vê que numero de estudos em publicações indexadas nos últimos 05 anos aumentaou mais de 10 vezes em relação ao período precedente.

 

– São carboidratos não digeríveis que possuem alta osmolaridade e/ou atuam como substratos rapidamente fermentados por micro-organismos intestinais.S ão representantes deste grupo: Oligossacarídeos – Fruto-oligossacarídeos (FOS) e Galacto-oligossacarídeos (GOS); Dissacarídeos – Lactose; Monossacarídeos – Frutose; Polióis – sorbitol e manitol. FODMAPs podem ser encontrados em diversos alimentos naturais, assim como constituintes de alimentos industrializados/ artificiais.

  • A frutose é um monossacarídeo do grupo dos FODMAPs, que pode ser encontrada principalmente no xarope de milho (usado em substituição ao açúcar em alimentos industrializados), néctar de agave, maça, pera, aspargos, cereja, melancia, sucos de frutas, ervilha.
  • A lactose é um dissacarídeo também desse grupo, encontrada em alta concentração no leite de vaca, leite de cabra, leite de ovelha, sorvete, iogurte, nata, creme, queijo ricota e cottage.
  • Frutanos ou FOS são oligoassarídeos presentes na cebola, alho-poró, trigo, cuscuz, farinhas, massas, centeio, caqui, melancia, chicória, alcachofra, beterraba, aspargos, cenoura, quiabo,  couve.
  • Galacto-oligossacarídeos (GOS) estão presentes em lentilhas, grãos de bico, grãos enlatados, feijão, ervilha, grãos integrais de soja.
  • E finalmente dentre os poliólis que são parte dos FODMAPs estão presentes em: xilitol manitol, sorbitol, glicerina, maçã, pêssego, nectarina, pêra, ameixa, cereja, abacate, amora, lichia, couve-flor e cogumelos.

 

– Para o paciente pode ser difícil pensar em onde o carboidrato está presente, sendo provavelmente mais fácil a consulta de tabelas que mostram alimentos ricos ou pobres em FODMAPs conforme grupo alimentar. Outra forma de apresentar os alimentos para que o paciente possa compreender melhor é dividindo em alimentos que alimentos que devem ser eliminados (com alto teor de FODMAPs), alimentos que podem ser consumidos a vontade (com baixo teor de FODMAPs), e alimentos que devem ser ingeridos com moderação (com teor moderado de FODMAPs).

 

Tabelas de alimentos e explicações adicionais podem ser encontradas nos seguintes sites da Federação Brasileira de Gastroenterologia e da Sociedade Brasileirea de Nutrição Parenteral e Enteral:

www.fbg.org.br/Publicacoes/noticia/detalhe/5

www.sbnpe.com.br/news-braspen/o-que-e-fodmap/ (foi removido do ar apos re-estruturação do site)

 

–  Embora agrupados como FODMAPs, cada carboidrato mal absorvido tem efeito fisiológico diferente. Os principais mecanismos propostos para sintomas intestinais são: o aumento do volume de água no intestino delgado, a produção colonica de gás, e a alteração da motilidade intestinal. A frutose aumenta significativamente o conteúdo de água no delgado, o que os frutanos determinam em grau muito menor. Frutanos distendem muito a luz do cólon, o que a frutose faz em grau muito menor. Manitol, sorbitol e lactulose sintética exercem força osmótica e aceleram o trânsito no delgado. A lactose atua com ambos os mecanismos: com força osmótica no delgado, e sendo fermentada no cólon. Sintomas ocorrem pelas alterações fisiológicas diretas, influências cefálicas indiretas, mecanismos imunes, estimulação da mobilidade e sensibilização do cólon. Estima-se que até 40% da população não absorva frutose e 50% não absorva polióis de forma eficiente, mas isso não implica necessariamente que são indivíduos sintomáticos. No caso da lactose, a má-absorção ocorre devido a deficiência ou ausência da enzima lactase – quase universalmente presente ao nascimento (deficiência primária de lactase é muito rara), porém um parcela significativa da população apresenta redução da atividade dessa enzima depois da primeira infância.

 

– A orientação da dieta pobre em FODMAPs deve ser realizada por profissional de saúde em casos selecionados, e idealmente esses pacientes devem ser acompanhados paralelamente por nutrólogo e/ ou nutricionista. O racional da orientação deve seguir os seguintes princípios:

1) Identificar alimentos com alto teor de FODMAPs na dieta do paciente sintomático;

2) Retirar alimentos por 06 a 08 semanas: melhora dos sintomas pode ocorrer já na 1a semana;

3) Se melhora, após o período limitado de exclusão, reintroduzir (por alimentos ou por grupos) para avaliar tolerância individualizada (em pequenas quantidades e de forma progressiva);

4) Se ausência de melhora após 08 semanas, descontinuar a dieta, visto que os sintomas devem ser então atribuídos à outra causa. Após as semanas de exclusão, em caso de melhora, deve-se procurar identificar os alimentos “gatilhos” de sintomas e manter a limitação ou exclusão do consumo apenas destes alimentos.

 

– E ainda, outros fatores de erros ou exageros dietéticos devem ser avaliados e corrigidos idealmente antes de colocar um paciente em dieta com baixo teor de FODMAPs: cafeína, gorduras, fibras insolúveis, regularidade / tamanho das refeições.

– Existem algumas ressalvas e limitações na dieta pobre em FODMAPs: muitos alimentos não estão nas listas, e não existe ponto de corte do teor de FODMAPs: isto é, não existe padronização para a classificação de um alimento quanto ao seu teor de FODMAPs em rico, pobre ou moderado. Muitas informações disponíveis em sites estão desatualizadas ou incompletas. Essas questões se relacionam a algumas das dificuldades dos profissionais de saúde em fazer as recomendações adequadamente. Outro ponto é avaliação do resultado da intervenção, visto que em doenças funcionais não há marcador, e o efeito placebo não pode ser quantificado.

 

– Vale lembrar que restrições extensas e prolongadas de FODMAPs podem levar a consumo insuficiente de fibras, carboidratos, cálcio, ferro, zinco, folato, vitaminas B e D, antioxidantes naturais. Dieta com baixo teor de FODMAPs gera importante restrição de alimentos consumidos com frequência na maioria das sociedades: trigo, produtos contendo lactose, muitas frutas e vegetais. O risco nutricional é ainda maior se limitação sócio-economica. E ainda a redução drástica da ingestão de FODMAPs tem consequências fisiológicas pouco compreendidas: alterações na microbiota e metabolismo colônico.

 

– Quanto à indicação da dieta com baixo teor de FODMAPs, a principal condição em que essa dieta foi estudada é na Síndrome do Intestino Irritável em pacientes adultos. Também se discute o seu papel em intolerâncias alimentares e na sensibilidade ao glúten. A eficácia da exclusão temporária de alimentos ricos em FODMAPs na redução de sintomas em adultos com Síndrome do Intestino Irritável reportada é em até 50 a 75% dos pacientes, com redução das queixas diminuem em, pelo menos, à metade. Há ressalvas quanto à qualidade da evidência: em muitos estudos não há grupo controle, é difícil realizar cegamento, há questões metodológicos no registro de como é feita a exclusão de alimentos. Pacientes frequentemente selecionam os aspectos da dieta que mais lhes atraem ou que são de mais fácil adesão.

 

– A dieta com baixo teor de FODMAPs já é bastante discutida para pacientes pediátricos. Entretanto, há poucos estudos que embasam sua eficácia e/ou orientam sua implantação para essa população específica. O manejo de sintomas gastrointestinais na população pediátrica é ainda mais desafiante. Muitos fatores precisam ser considerados, incluindo aspectos biológicos relacionados crescimento e desenvolvimento, psicológicos, comportamentais, sociais, familiares. A alimentação tem potencial no alívio de sintomas gastrointestinais da infância.

– Há um crescente interesse do papel dos FODMAPs na cólica do lactente, dor abdominal crônica e  síndrome do intestino irritável pediátrica. Recente estudo do grupo da Universidade de Monash comparou a dieta típica da infancia americana (com teor de FODMAPs moderado a alto) com dieta com baixo teor de FODMAPs em crianças de 07 a 17 anos com o diagnóstico de Síndrome do Intestino Irritável, mostrando com apenas 02 dias de dieta as crianças já apresentam melhora significativa da dor abdominal.

– Pontos fundamentais para estabelecer com sucesso uma dieta em pacientes pediátricos incluem, mas não se limitam a: comunicar “adultos-chave” que fazem parte do cuidado da criança (professores, profissionais de saude, cuidadores, amigos); envolver a criança – dependendo da idade, ela pode compreender uma explicação simples e auxiliar na escolha de substituições de alimentos; armazenar e preparar alimentos antes do tempo – porque os alimentos com alto teor de FODMAP são mais disponíveis que aqueles com baixo teor; não deixar de reintroduzir os alimentos – a dieta de exclusão é muito restritiva, pode se tornar monótona e implicar em restrição de nutrientes importantes; achar quais FODMAPs a criança consegue tolerar pequenas quantidades. Outro ponto fundamental é de que de uma maneira muito significativa, a dieta baixa em FODMAP é significativamente diferente das restrições dietéticas exigidas para crianças com alergias alimentares ou doença celíaca – comer um alimento restrito não causará dano significativo a saúde, apenas sintomas.

 

 

Referencias bibliográficas:

  • Site da Federação Brasileira de Gastroenterologia: www.fbg.org.br/Conteudo/2248/49/Dieta+com+baixo+teor+de+fodmaps
  • Spiller R. How do FODMAPs work? J Gastroenterol Hepatol. 2017;32 Suppl 1:36-9.
  •  Chumpitazi BP, Shulman RJ. Dietary Carbohydrates and Childhood Functional Abdominal Pain. Ann Nutr Metab. 2016;68 Suppl 1:8-17.
  • Shepherd S, Gibson P. The Food Intolerance Management Plan. Melbourne: Viking Australia, 2011.
  • Giulia Catassi, Elena Lionetti, Simona Gatti and Carlo Catassi.The Low FODMAP Diet: Many Question Marks for a Catchy Acronym. Nutrients 2017, 9, 292; doi:10.3390/nu9030292.
  • O’Keeffe M, Lomer MC. Who should deliver the low FODMAP diet and what educational methods are optimal: a review. J Gastroenterol Hepatol. 2017;32 Suppl 1:23-6. 10.3390/nu9030292.
  • Eswaran SL, Chey WD, Han-Markey T, Ball S, Jackson K. A Randomized Controlled Trial Comparing the Low FODMAP Diet vs. Modifi ed NICE Guidelines in US Adults with IBS-D. Am J Gastroenterol advance online publication, 11 October 2016; doi: 10.1038/ajg.2016.434
  • Giorgio RD, Volta U, Gibson PR. Sensitivity to wheat, gluten and FODMAPs in IBS: facts or fiction? Gut 2016;65:169–178.
  • Marina Iacovou. Adapting the low FODMAP diet to special populations: infants and children. Journal of Gastroenterology and Hepatology 2017; 32 (Suppl. 1): 43–45
  • Site de saúde “verywell”: https://www.verywell.com/the-low-fodmap-diet-for-children-1944673
  • Site da Monash University: http://fodmapmonash.blogspot.com.br/2015/11/low-fodmap-diet-kids.html

 

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