INSUFICIÊNCIA HEPÁTICA AGUDA (IHA)
-
Insuficiência hepática aguda é classicamente definida (definição da década de 70) pela evolução para encefalopatia em menos de 8 semanas, e ausência de doença hepática crônica.
-
Em pediatria, muitas vezes difícil definir encefalopatia (sobretudo em crianças menores, que podem apresentar apenas irritabilidade).
-
Trata-se de um evento raro. Em geral, mesmo grandes centros, transplantam em média 5-8 casos por insuficiencia hepática aguda por ano. O correto/ideal é que esses centros recebam e manejem essas crianças, ainda que na evolução elas não vão à transplante.
-
A letalidade chega a ultrapassar 1/3 dos casos. A história natural é dificil de ser discutida, uma vez que essa não pode ser propriamente estudada de forma randomizada por questões éticas. Crianças são listadas para transplante e se tornam prioridade para Transplante em nível nacional.
-
O pediatra precisa identificar crianças em risco de evolução ruim, visto que muitas vezes a criança apresenta inicialmente em excelente estado geral, porém mesmo assim pode evoluir gravemente em horas. A regra deve ser encaminhamento precoce para centros que realizam transplante e tenham experiencia no manejo de IHA.
-
De um modo geral, alguns colegas pediatras se assustam muito com números elevados de transaminases, quando na verdade o que mais importa são os marcadores de falência de síntese, sobretudo o INR – que se altera preococemente. Por exemplo, em hepatite A vê-se transaminases >1000, mas muitas vezes sem anormalidade de INR – casos, via de regra, de boa evolução; já no outro pólo, a IHA por doença de Wilson pode se apresentar com transminases relativamente baixas e, em geral, comumente apresenta-se com INR alterado e tem prognostico bastante reservado.
-
Portanto, o INR é o grande divisor de águas! Sobretudo na ausência de resposta a vitamina K.
-
Mesmo que as enzimas estejam importantemente alteradas, a presença de INR normal é relativamente tranquilizante. O que não significa que o paciente pode simplesmente receber alta. Alguma forma de seguimento precoce desse paciente deve ser garantida, e sinais de alarme (sobretudo sangramento e piora da ictericia) devem ser orientados.
-
O INR que corrige com vitamina K: ainda precisa de avaliação por especialista, idealmente no máximo em 07 dias – na ausência dessa possibilidade, algum seguimento clinico-laboratorial da criança, o mais precocemente deve ser garantido, ainda que seja um retorno e reavalição no pronto antendimento em 48-72 horas.
-
INR >2 deve ser sempre um sinal de alarme
-
Na presença de INR alterado, Vitamina K deve ser administrada e INR repetido em 6 horas. Na ausência de melhora, o pediatra deve contatar especialista/ centro de referência em transplante para que o paciente seja precocemente encaminhado, e admitido em local que possa receber suporte adequado.
-
É muito importante observar que a evolução dos pacientes pode ser bastante rápida!! O bom estado geral na apresentação inicial não deve tranquilizar o médico que avalia a criança.
-
Encaminhar urgentemente (para centros que realizam transplante e tenham experiencia no manejo de insuficiencia hepatica): INR não corrigível > ou = 1,5 na presença ou suspeita de encefalopatia, ou se INR não corrigível> ou = 2,0 independente da presença de encefalopatia (critérios de IHA)
-
A icterícia nem sempre está presente: aproximadamente 70% dos casos
-
Média de INR na insuficiência hepática aguda: 2.6.
-
Média de ALT: aproximadamente 1500 (varia de 200-300 para mais de 3000)
-
Investigação etiológica deve considerar a idade. Além das sorologias para Hepatites virais clássicas, se disponíveis devem ser pesquisados enterovírus, HHV, parvovírus, CMV, EBV, HSV (sobretudo em lactentes), …
-
Em geral a ceruloplasmina não deve ser incluída na avalição de crianças menores de 3-4 anos.
-
Até 50% dos casos pediátricos tem etiologia indeterminada.
-
É fundamental um boa história de exposição a toxinas, medicamentos, drogas, ervas.
-
Doença de Wilson com apresentação fulminante tem em geral as seguintes caracteristicas: idade>5 anos, INR bastante alargado, fosfatase alcalina baixa, hemólise, disfunção renal. Na suspeita, avaliação oftalmológica para anel de kayser fleischer deve ser realizada precocemente. É um cenário específico da insuficiência hepática, de prognóstico particularmente ruim.
-
Se não houver a possibilidade de transferencia precoce da criança, um centro com gastroenterologista/hepatologista experiente deve ao menos orientar as condutas até que a situação da transferência seja resolvida.
Medidas gerais na admissão:
-
Na fase hiperguda, exames laboratoriais devem ser repetidos a cada 4-6 horas devido ao alto risco de disturbio hidroeletrolíticos, coagulopatia/hemorragia, anemia aplásica, pancreatite, convulsões. Se estabilidade, esse intervalo pode ser aumentado para a cada 12-24h. Monitorar amonia
-
Atenção especial deve ser dada ao risco de hipoglicemia: muitas vezes necessário soro glicosado a 10% na manutenção – ou mesmo concentrações maiores, não compatíveis com veia periférica.
-
Garantir acesso venoso calibroso.
-
Evitar o uso de sedativos
-
Evitar aminoglicosideos e outros nefrotoxicos
-
Limitar aporte proteico a 1g/kg (controverso)
-
Administrar lactulose (10-30 mL, até 3x/dia), em doses altas visando 1-2 evacuações/dia. Titular dose conforme consistencia das evacuações
-
Baixo limiar para investigar e tratar precocemente infecção (bacteriana e HSV)
-
Fluimucil (n acetilcisteina) não deve ser administrado “por via das dúvidas” quando não houver toxicidade comprovada ou forte suspeita de IHA por paracetamol. Dose efetiva é alta, e administração para pacientes não intoxicados por paracetamol piora o prognóstico na IHA.
———————————————————————————————————————————
“DISCLAIMER”/ aviso legal: o objetivo dessa página é compartilhar conhecimento médico, visando um público alvo de médicos, pediatras, gastroenterologistas pediátricos, estudantes de medicina. Os conteúdos refletem o conhecimento do tempo da publicação e estão sujeitos a interpretação da autora em temas que permanecem controversos.
A linguagem é composta de linguagem/jargões médicos, uma vez que não visa o público de pacientes ou pais de pacientes. O conteúdo dessa página não pode nem deve substituir uma consulta médica.
As indicações e posologia de medicamentos podem mudar com o tempo, assim como algumas apresentações ou drogas podem ser retiradas do mercado.
Em caso de dúvida relacionada ao conteúdo ou se algum dado incorreto foi identificado, entre em contato!