Utilidade dos testes de diagnóstico em crianças com Dor Abdominal sem sinais de alarme

3 de fevereiro de 2020

Utilidade dos testes de diagnóstico em crianças com Dor Abdominal sem sinais de alarme

  • A criança com dor abdominal sem sinal de doença organica consititui um desafio clinico. A ausencia de causa organica não se significa manifestacoes de carater leve.
  • A fisiopatologia das dos disturbios de dor abdominal funcional não foram totalmente esclarecidas. Considera-se multifatorial, com elementos que incluem predisposição genética, eventos adversos da primeira infância, processamento sensorial anormais (hiperalgesia) e problemas psicossociais ambientais e ambientais.
  • Assim sendo, não há biomarcadores para diagnosticar esse grupo de distúrbios.
  • Os critérios de Roma são uma ferramenta de diagnóstico clinico para os distúrbios gastrointestinal funcional.
    Sua última edição, Roma IV,  foi publicada em 2016. Auxiliam a compreensão de diagnósticos, e uniformização de nomenclatura, alem de  fornecer recomendações para o manejo – entretanto, algumas vezes, esses criterios pode ser um tanto restritivos.
  • Os critérios de Roma IV não afirmam mais que o diagnóstico de disturbios de dor abdominal funcional  é feito na ausência de alterações anatômicas, bioquímicas ou estruturais. Essa mudança ocorreu em resposta a um excesso de teste diagosticos que era realizado, pois  a “ausência de alterações anatômicas, bioquímicas ou estruturais” foi mal interpretada/compreendida pelos clínicos. Pelo guideline atual  a decisão do teste é deixada ao clínico –  sem um onus de provar a ausencia de causa organica.
  • Uma percepção comum por alguns profissionais é que as famílias não aceitem um diagnóstico de doença funcional  sem investigações prévias. No entanto, essa visao é questionavel. Ha trabalhos mostrando que  que a maioria das famílias, através da educação, pode ser  tranquilizada/ assegurada que não há necessidade de realizar testes extensivos em casos de diagnósticos funcionais claros. Um relatório técnico da Academia Americana de Pediatria (AAP) ea Sociedade Norte-Americana de Gastroenterologia Pediátrica, Hepatologia e Nutrição (NASPGHAN) publicado em 2005 concluiu que, na ausência de recursos de alarme, não ha base para realizar testes diagnosticos.
  • A ultrassonografia abdominal é a modalidade de imagem mais comumente usada, porem acredita-se que seu uso seja mais relacionado à necessidade de tranquilização do que à expectativa de encontrar uma etiologia específica. A ultrassonografia abdominal não contribui significativamente para o diagnósticoem pacientes com dor abdominal recorrente na ausencia de uma suspeita diagnostica especifica. Embora relativamente inocuo – não invasivo e sem radiação – tem custos, pode levar a achados incidentais (e consequentes investigações subsequentes) e pode somar a ansiedade parental. Vale lembrar tambem que trata-se de um exame operador dependente.
  • A calprotectina fecal é uma proteína de ligação ao cálcio presente principalmente no citosol de neutrófilos, monócitos e macrófagos ativados. Ligada ao cálcio, fica estável nas fezes por ate 7 dias em temperatura ambiente. A elevação da calprotectina fecal reflete a migração de celulas inflamatorias através parede intestinal. Varios estudos têm investigado o papel da calprotectina fecal para diferenciar  disturbios de dor abdominal funcionalde outras doenças inflamatórias, especialmente doença inflamatória intestinal (DII). Aceita-se em geral um valor de corte de 50 µg/g, em pacientes acima de 4 anos. Sugere-se que nos casos de calprotectina fecal normal em quadro mais sugestivo de doença funcional não há necessidade de realizar qualquer avaliação endoscópica. Já se suspeita principal for de DII, deve-se proceder com a investigação com endoscopia/colonoscopia independente do resultado da calprotectina ser normal. Importante lembrar que ha risco de resultados falso-positivos, como em casos de pólipos, uso de inibidores de bomba de prótons ou ou anti-inflamatórios não esteróides, e outros processos inflamatórios. E há também o risco de falso negativo – apesar de ser o melhor marcador de DII, é bem descrito que DII pode acontecer com calprotectina normal. O papel da calprotectina fecal em dispepsia ou doença de refluxo não esta esclarecido. Valores normais para crianças menores de 4 anos também não foram determinados.
  • Sorologia para doença celíaca (DC): a DC é uma enteropatia crônica autoimune que pode se desenvolver em indivíduos geneticamente predispostos expostos ao glúten na dieta. Manifestações clínicas são altamente variaveis, incluindo dor abdominal que pode “imitar” um disturbio de dor abdominal funcional (mais comumente sindrome do intestino irritavel). Na pratica, a maior parte das crianças que se apresenta com a queixa de dor abdominal, acaba realizando IgA e anti-transglutaminase para avaliação da potencial presença de deonça celiaca.
  • Uma das grandes questões diante de uma criança com dor abdominal é a realização ou não de avaliação endoscopica. Trata-se de avaliação, com necessidade de anestesia geral em pediatria. Diretrizes não recomendam o uso de endoscopia digestiva alta para o diagnóstico de refluxo e / ou infecção por H. pylori em casos com caracteristicas funcionais. A Sociedades Europeia e Norte americana de de Gastroenterologia Pediátrica, Hepatologia Nutrição Pediatricas (ESPGHAN e NASPGHAN) recomenda contra uma estratégia de “testar e tratar”  a infecção por H. pylori em crianças e adolescentes, bem contra a pesquisa de  H. pylori m pacientes sem sinais de doença ulcero-peptica. Vale lembra que esofagite eosinofilica fas parte do diagnostico diferencial de dor abdominal, embora mais tipicamente tenha manifestações relacionadas a disfagia ou refluxo.
  • De maneira semelhante, a utilidade da colonoscopia em dor abdominal cronica não é clara. Um estudo retrospectivo australiano relatou que 10% das colonoscopias  nessa indicação apresentaram achados anormais – porem todos esses pacientes tinham calprotectina fecal anormal e/ou marcadores inflamatórios séricos elevados.
  • Em conclusão, há evidências limitadas para realizar testes em crianças com dor abdominal cronica na ausência
    de sinais de alarme. Avaliações devem ser direcionadas conforme suspeita clínica de uma possível condição orgânica. As evidências atuais não justificam a necessidade de testes diagnósticos de rotina.

 

FONTE:

Utility of Diagnostic Tests in Children With Functional Abdominal Pain Disorders

(Alejandro Llanos-Chea, MD, and Miguel Saps, MD)

https://www.ncbi.nlm.nih.gov/pmc/articles/PMC6771033/pdf/GH_15_414.pdf

 

 

 


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