Transplante de microbiota fecal (TMF)
– Apesar de descrito de forma informal há muito tempo, o TMF foi cientificamente relatado pela primeira vez em 1958 para o tratamento de colite por C. difficile
– Definição: introduzir da comunidade microbiana intestinal de um indivíduo saudável a um indivíduo com doença. O doador é submetido a um extenso processo de screening médico e social, além de screening de infecções (sangue e fezes), sendo as taxas de aceitação de doador <3%. A microbiota fecal doada tem que ter diversidade apropriada. O TMF pode ser administrado nas formas “purificada”, modificada, extraísa, encapsulada e pode até ser criado de forma sintética.
– Apoós o TMF, o microbioma do receptor muda evolutivamente, adquirindo características do doador, mas também retendo algumas características do receptor. Mudanças gradativas continuam a ocorrer até 6 meses após o transplante.
– Dose típica é de 50 a 100 gramas de fezes. Doador pode ser direto ou conhecido do receptor ou vir de banco de fezes. O material é processado: diluídom misturado e filtrado, chegando a um volume final bastante variável de 30 a 250 mL. A via de entrega pode ser sonda (nasogástrica, nasoduodenal ou nasojejunal), endoscopia (EDA ou colono), enema, ou capsulas (em geral 1 dose seriam 30 cápsulas).
– Sociedades Norte Americana e Europeia de Gastroenterologia, Hepatologia e Nutrição Pediátricas (NASPGHAN e ESPGHAN) emitiram um “Society paper” conjunto. Nesse, as indicações atuais do TMF em pediatria são bem definidas:
* Infecção recorrente por C. difficile dentro de período de 8 semanas com um dentre: 3 ou mais episódios de infecção por C. difficile moderada a grava e falha durante o desmame da Vancomicina; ou 2 ou mais episódios graves de infecção por C. difficile com hospitalização e morbidade significativa
* Infecção moderada por C. difficile não responsiva ao tratamento
* Infecção grave ou fulminante por C. difficile que não responde a terapia inicial em 24-48 horas (rara em pediatria)
– Sem dúvida a maior experiência co TMF é no tratamento da infecção por C. difficile, tanto em adultos quantoem pediatria. Eficacácia de 80-90%. A primeira criança tratada com TMF para C. difficile recorrente foi reportada em reportada em 2010 (referencia abaixo – Ruessel et al, periódico Pediatrics) em uma criança de 2 anos que recebeu FMT via sonda nasogástrica.
– Registro dos EUA reportado em 2019 relatou 335 que receberam TMF em 18 centros nos EUA: 81% de cura depois de um TMF único, 86.6% em pacientes que receberam 2 ou mais. Taxa reportada de eventos adversos grave foi de 4.7%, incluindo 10 hospitalizações e casos de descompensação/atividade de doença inflamatória intestinal subjacente. Nesses estudo os fatores preditores de sucesso para o TMF em pediatria incluíram: uso de fezes frescas, entrega via colonoscopia, ausência de sonda para alimentação, apenas 1 TMF (referencia abaixo – Nicholson et al, periódico Clin Gastroenterol Hepatol)
– Há estudo pequeno retrospectivo com TMF em colite alérgica do lactente – TMF administrado via retal em 19 lactentes com doação dos pais, alguns receberam multiplos TMF (referencia abaixo – Liu et al, periódico World J Gastroenterol), 17 tiverem alivio do sintomas de colite alérgica em 2 dias. Este estudo foi publicado em 2017, sem grupo controle e ainda não replicado (3 anos depois! o que leva a certo questionamento da animosidade inicial nessa indicação especificamente).
– Também de 2017, um estudo também pequeno e não cego foi realizado com 18 pacientes com transtorno do espectro autista e sintomas gastrointestinais, que comparado a um grupo controle, apresentou melhora significativa de sintomas gastrointestinais e comportamentais após TMF (referencia abaixo – Kang et al, periódico Microbiome)
– É fundamental notar que o TMF não é isento de efeitos colaterais e eventos adversos, tendos riscos relacionados ao procedimento (aspitação, perfuração), a transmissão de infecções – CMV, Listeria, E.coli ESBL* (relato de dois casos – um sendo fatal), e relacionados a resposta inflamatória e risco de exacerbar doença inflamatória intestinal
– Em conclusão, o transplante de microbiota fecal está nas suas fases iniciais, já tendo se mostrado eficaz e relativamente seguro para infecções recorrentes por C. difficile (inclusive em pediatria). O TMF pode ter potencial terapêutico em muitas outras indicações, mas dada a evidencia atual limitada, o uso clínico ainda deve se restrito à infecções recorrentes por C. difficile. Não é um tratamento isento de risco.
.
.
REFERENCIAS: